segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

o diferente


Os seres humanos querem, cada vez mais, pessoas menos diferentes deles. Precisam de seres que sejam basicamente iguais. Isso tudo para evitar ver a diferença. A diferença assusta porque escancara o que você é e o que você não é. Se todos chegam do trabalho reclamando, cansados, sonhando com as tão desejadas férias, você fica tranquilo: eu estou na merda, mas ele também está, é assim que a vida de um trabalhador tem que ser.
            É reconfortante saber que ninguém está fazendo nada além do esperado, inclusive você. E, por isso, que é um absoluto incômodo alguém ser e estar diferente de você. O ser diferente expõe as suas fragilidades que você sabe que existem, mas não quer nem ousar ver. Dói demais se auto-reconhecer. Se perceber.
            Num mundo tão pasteurizado, tão homogêneo, o artista sempre terá a função de expor as diferenças. Não são melhores, nem piores. São apenas diferentes. E, como disse, a diferença abre seus olhos. Abre sua mente. Não digo que seja fácil. Mas o quanto antes isso acontecer, melhor. Vai doer, mas passa rapidamente.
Aceite as diferenças como forma de melhorar a sua vida. Por que uma coisa é fato: não tem como negar o diferente. Se ele existe, ele te incomoda. E o máximo que você pode tentar fazer é fingir ignorá-lo. Mas você jamais vai deixar de perceber. É como alguém te dar uma internet grátis para fazer pesquisa e depois você insistir em voltar a usar a Barsa. Nunca mais será a mesma coisa.
Se você acha que o mundo é uma grande merda, vai te incomodar muito alguém que pensa o contrário. Alguém feliz. Se você acha que o mundo é um conto de fadas, vai te incomodar muito alguém que jogue bombas de raiva.
O oposto incomoda, mas ensina. Aprenda com ele. Por que ignorá-lo só irá te fazer mais ignorante. Existe um bom motivo para o diferente te incomodar, e geralmente é porque revela que você não é tão X ou Y quanto você achava. Você já quis ser feliz, ou mesmo já quis explodir alguma coisa.

O ignorante é aquele que recusa a se enxergar pelas novas lentes que agora usa. E por isso é tão ignorante: no fundo, ele sabe, mas tem medo. O ignorante é um grande de um covarde. E provavelmente o mais triste dos seres.

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

sobre desistir


Quando o sentimento de desistir passa por perto, ele traz junto dele um outro sentimento: de ter conseguido algo. Você só pode desistir de algo que já tem/fez. E é a partir dessa lógica que a “desistência” deve ser analisada, antes de ser concretizada de fato. 
            Muitos acreditam que “desistir” é o retorno à velha paz. Àquele momento em que não era necessário ter a pressão de ser ou fazer algo. Seja no trabalho, seja nas relações pessoais, seja em relação aos seus sonhos.
Existem diversas formas de mudar de caminho, mas “desistir” é simplesmente acabar com o caminho. Destruí-lo. Não estou dizendo que o importante é não destruir. Apenas dizendo que, uma vez deletado, nunca mais existirá, e mesmo que se volte a fazer isso, será feito por outro caminho.
E nesse vaivém de pensamentos, imagino como seria desistir de tudo, neste momento. Em termos práticos, não precisaria fazer muita coisa: basicamente, se eu parar de fazer, já acabo com tudo. Posso simplesmente não postar mais nenhuma crônica. Não fazer mais nenhum vídeo do TPM. Não escrever mais nenhuma palavra. Não enviar mais nenhum projeto para frente. É fácil desistir quando se é empreendedor: pare e pronto.
Mas como tenho boa imaginação, costumo viver na minha mente como seria realmente desistir de tudo. Me vejo daqui uns dias, daqui uns meses e uns anos. Analiso cuidadosamente, dentro do meu espectro imaginário, todas as possibilidades. E sempre me vem uma imagem: eu, sentado, olhando pro teto, sem saber o que fazer, morrendo de angústia. Quando chego nessa imagem, rebobino toda a imaginação e guardo dentro de mim: não é nisso que quero chegar.

E, de repente, fica fácil não desistir. Simplesmente ver como será (na minha imaginação, claro) e seguir caminho. A chave de qualquer sonho é a persistência. E “desistir” é o mundo sem “persistir”. Desista apenas quando sua imaginação disser que, daqui uns anos, você vai estar melhor do que está agora. Caso contrário, persista.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

2015: pro bem e pro mal

            Recentemente, li um post no Facebook que dizia que este ano de 2015 estava como as propagandas da Polishop: “E não é só isso! E ainda tem mais isso! E se fechar agora, tem mais aquilo!”. Faltando pouco mais de duas semanas para acabar o ano, começo a ficar preocupado.
            Já rotulei este ano como “intenso”. Em todos os sentidos: pro bem e pro mal. Todos os astrólogos, numerólogos, visionários, adivinhos, todos já definiram: um ano de acontecimentos. Faleceu gente, nasceu gente. Empresas foram fechadas, empresas foram abertas. Pessoas demitidas, pessoas empreendedoras. Perderam dinheiro, ganharam dinheiro. Escolas fecharam, escolas foram ocupadas. Na política, nem se fale. Pouquíssimas coisas se mantiveram em seu lugar; quase tudo mudou.
            E o medo é que ainda temos 16 dias para o final do ano. E quando alguém comenta “Ufa, esse ano acabou”, eu logo alerto: CUIDADO! Muita coisa pode acontecer nesse período ainda. Não esqueçam que ainda temos os eventos de Natal e Ano Novo. Fico assustado com as mil e uma possibilidades. Pro bem e pro mal.
            Penso se não é caso de se exilar do mundo até o Reveillon. De repente, a gente postergar todas as porradas que ainda estão por vir. Mas fico receoso: pro bem e pro mal. Vai que aparece alguma coisa boa e estou em um contêiner anti-bomba nuclear?
            Reflito e concluo: as porradas vão vir de qualquer forma. As energias cósmicas decidiram fundamentadas com a mesma teoria do band-aid: vai de uma vez só que dói menos. As transformações de 2015, se pulverizadas para parecerem “normais” nas nossas vidas, demorariam pelo menos uns 15 anos, num marasmo de coisas boas e ruins.

            Então, vieram com tudo. O que posso esperar é que o ano que vem seja mais pacífico. Seja menos turbulento, menos “completamente retardado” que 2015. Nostradamus disse: “2015 vai ser f&#@, mas vai passar”. Pro bem e pro mal.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

escrever sob pressão

            
Cá estou eu, quase três da tarde desta segunda-feira nublada, com hora pra sair e lembro que não postei a crônica! Semana passada, atrasei uns três dias. Não poderia repetir o mesmo erro, já que eu me gabo tanto de conseguir postar uma crônica por semana. Mas sabe como é... acabei de desligar o telefone com minha avó e a conclusão foi: final de ano é uma bagunça. É mesmo.
            Mas para ninguém sofrer – leia-se “eu” -, escrevo. Sob pressão, mas escrevo. Escrevo sobre escrever e sobre ter que correr pra escrever. Muitas vezes, escrever sem pensar, sem revisar, sem repensar, sem visar nada, esperando que, com sorte, um final para este texto chegue enquanto o escrevo.
            Claramente, ainda não chegou. Para encontrá-lo, procuro em mim mesmo. Procuro no ser que digita e encontro semelhanças, encontro simetrias. Somos como esse texto, não sabemos muitas vezes para onde estamos indo. Não sabemos se o que já deixamos marcado foi bom ou foi ruim. Muitas vezes, não há tempo para nada, nem para ler. Muitas vezes divagamos, outras, decidimos mudar de parágrafo e ponto.
            Nem tudo na literatura e na vida precisam de uma meta determinada. Aliás, quase nada precisa. Só nós que precisamos, para acalmar o espírito que se acalenta a cada hora. Se de alguma coisa vale, lembremos de Beatles e a famosa “Let it be”. Se é muito antigo para você, Frozen ensina: “Let it go”. Deveríamos escutar mais e sofrer mesmo com a pressão.
            Deveríamos relaxar. Nós colocamos a pressão em nós mesmos: Victor, você vai abrir um blog para escrever toda semana, especificamente, todas às Segundas-feiras. Pronto, empreendi. Criei a minha própria pressão.

No fundo, todos precisam criar a própria pressão e acabar com ela. Isso traz maturidade. Que a gente nunca deixe de escrever. Mas que a gente um dia relaxe e desencane. Vida longa enquanto tudo durar!

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

aula de teatro no Poder Jovem


Estou atrasado com a crônica que deveria sair na Segunda e atrasado com o dia 1º de Dezembro, dia Mundial da Luta contra AIDS. Um pouco atrasado em tudo, como todo final de ano costuma ser.
            Em um aniversário meu, uns 4, 5 anos atrás, minha tia me ligou, me parabenizou e me fez um convite: se eu não gostaria de dar “uma força” para o teatro da turma do Poder Jovem, um braço para adolescentes da ONG VER, no Hospital Emílio Ribas. Aceitei sem saber o que era Poder Jovem, o que era o VER e o que era HIV-AIDS.
            No sábado em que cheguei, minha tia gentilmente me apresentou como “professor de teatro” e, de repente, tinham uns vinte adolescentes esperando que eu conduzisse as próximas duas horas. Caí de paraquedas e por lá fiquei por uns 2 anos e meio, sem nunca questionar.
            Entre risos e berros, maluquices, falecimentos e emoções, chegamos a fazer cinco peças de teatro. As aulas eram no auditório ou na laje do hospital (diga-se de passagem, uma loucura completa dar aula lá). Tinha que ser duro muitas vezes. E tinha que ser mole. Nunca havia entendido – e nunca entendi direito – o que era ser portador do HIV. Ter AIDS. O lema sempre foi: vivendo e convivendo. E terminou em “somos todos convivendo”.
            Lembro da primeira vez que tivemos que parar a aula para visitar um aluno que estava internado nos andares de cima do hospital. Lembro de quando o Marcinho, um dos rapazes mais ativos, faleceu. Lembro de abraços, de lágrimas, de risadas. Lembro de insistir para o Thiago em me atualizar com o São Paulo. E do grande general romano Silas. E da Bruninha brava que estava de faxineira na peça. E das batidas de mão com o Betinho. Do Pedrinho que pulava na minha perna. Do Felipe tocando violão. Da Hellen e suas coreografias incríveis. Do Vinícius para sempre Severino. Do dia que perdi uma aposta e tive que dar aula com a camiseta do Corinthians. Do espírito guerreiro da Sandra e da Silvia. Lembro de quando o querido Marcelinho faleceu. Lembro da Thalita, da Evellyn, da Renata, da Aline indo para a PUC. Lembro de todos, mesmo esquecendo de escrever aqui. E, na verdade, lembro quase nada do HIV-AIDS.
            Uma das peças foi “O Pedido da Morte”. Apresentei aos alunos uns dez textos e esse era o único que eu tinha escrito. Apresentei com receio, achando que falar de morte seria um tanto quanto inconveniente, por ser um assunto tão presente. Em dois minutos, a sala já havia escolhido: era esse mesmo que queriam fazer para o final de ano. Sobre morrer, mas, principalmente, sobre viver intensamente. Viver feliz. Viver fazendo a Morte invejar você todos os dias.
            Tinha por objetivo com esse texto aproximar a Morte de mim e olhá-la nos olhos. E quando eu vi, todos os garotos e garotas já lidavam com isso diariamente. E mais ainda: sorriam, dançavam, pulavam, cantavam. Fiquei imaginando a Morte, cheia de pose, chegando perto deles. E eles esnobando! Fiquei pasmo. Era para ser tratada de maneira muito séria. Seriamente engraçada, para eles. Eles não tem medo Dela. Eles aprendem com Ela todos os dias.

            Foi uma das lições mais valiosas que tive na vida. Eles acham que eu ensinei alguma coisa para eles. No final, fui eu quem aprendi sobre viver e sobre lidar com a Morte, assunto que deveria ser obrigatório em todas as escolas da vida. Obrigado tia Glória por me arremessar no meio de tanta gente incrível. Obrigado a todos vocês do Poder Jovem por ensinarem a viver intensamente, viver feliz. Somos todos convivendo.