segunda-feira, 31 de agosto de 2015

cuidem de nós, os freelas

            
As pessoas deveriam respeitar os seres que vivem de tentar vender projetos. Parece que há um descaso, uma agressão proposital, uma inveja escondida. Alguma coisa existe que transforma o caráter de alguns seres humanos em ruim, podre, e passam a desrespeitar os que vivem esperando uma resposta.
            Digo isso pois somos constantemente abordados por retardados que não sabem como dar “oi”. Nascemos sabendo que não podemos chegar num velório e berrar, ou chegar de fininho em quem está dormindo e dar um susto. Ou pedir um aumento no meio de uma reunião com clientes. Temos noção, somos cuidadosos. Mas somos poucos.
Boa parte não sabe quão delicado é o nosso coração. Perguntem ao meu cardiologista. Ele vai confirmar. Quem vive esperando respostas deveria ser tratado da maneira correta. E quem desrespeita, ser preso. Deveria estar no Código Penal, na Constituição, nos 10 Mandamentos ou na parede da escolinha. Matéria obrigatória na faculdade.
            Posso estar parecendo louco, mas quem compartilha comigo a vida de vender projetos sabe. Não há nada pior que informação errada.
Por exemplo, deveria ser proibido mandar e-mails na conta pessoal. Cada (1) que aparece na aba da internet enquanto trabalhamos quase nos faz pular pela janela. Será que são eles?! Viram o projeto?! Gostaram?! Vamos com tudo?! Não. Apenas uma corrente do bem que manda para o inferno quem não repassa. De repente, cavei meu próprio buraco sem repassar.
            Também deveriam banir da existência aqueles que ligam no seu celular e você não tem o contato. Uma infinidade de possibilidades se abrem. Viram o projeto?! Gostaram?! Simbora?! Não. Apenas o banco oferecendo crédito especial em troca de juros infinitos. Ou engano, que deve ser pior.
            Ou poderiam desaparecer com aqueles desconhecidos que ainda vivem no milênio passado e enviam cartas. Sem remetente. Tantas opções, tantas possibilidades. Eles viram o projeto?! Será que são eles?! Fechado?! Mas é apenas seu carteiro pedindo a caixinha de Natal.
            Não é simples cuidar dos nossos corações quando a qualquer momento pode vir uma resposta de alguém importante. São tantas emoções que imploro, por favor, não nos matem. Entendam que somos frágeis. Culpo a ansiedade. Tem aqueles que culpam a sociedade. Outros culpam a idade. Cada um com sua justificativa, todos com a mesma certeza. Parem com isso. Sejam relevantes.

Meu medo – e que será o seu também - é se você estiver fazendo de propósito. Cuidado, te jogo no spam, bloqueio sua ligação e queimo suas cartas. Proteja-se de nós, somos perigosos.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

susto: uma arte a ser descoberta


Pouquíssimo se fala na maravilhosa arte de “dar susto”. Um filme ou outro, com monstros e carregadores de energia, mas sempre de forma pejorativa, menor do que se deveria.
            Dar susto é uma arte. E explico o porquê: existe todo um conhecimento prévio, existe uma preparação, existe uma execução e, principalmente, como todas as formas de arte, você faz por apreço e não por obrigação. Sem motivo algum, quase matamos as pessoas do coração.
            Como toda arte incrível, também no susto existe uma satisfação pessoal pela obra bem realizada. Quanto mais o coração do outro parar, melhor. Claro que essas conclusões não vieram de livros ou aulas. Tudo que conheço desta bela forma de arte foi aprendido na base da experiência científica.
            Minha família tem uma casa em Campos do Jordão. A casa tem uns 100 anos, com fogão a lenha e portas que rangem. Clichê, eu diria. Mas propícia para o susto. E a família sempre se reúne na sala onde tem uma fogueira. E a fogueira só funciona muito bem quando tem as famosas “garras do tio Mário”, que são garras secas que caem das árvores.
            Naquela noite pacata, as garras haviam acabado. Todos estavam com medo, mas meu irmão e meu primo tomaram as rédeas e disseram que iam no meio do mato atrás de garras. Um tanto quanto imbecil, já que são sempre essas ideias nos filmes de terror que dão errado. Mas eles foram.
            Minha cabeça estava a mil por hora. Era o grande momento. Os dois pegaram seus tênis, suas lanternas, um pedaço de pau caso encontrassem algo e uma sacola para colocar as garras.
            Aqui faço um parênteses: os melhores sustos não são os que você aparece gritando, ou dá um berro para amedrontar alguém. São aqueles que você não faz nada e os outros quase morrem do coração. Fecha parênteses.
            Eles saíram. Dei um minuto e afirmei que ia ao banheiro. Pulei a janela e saí da casa, sem lanterna, sem nada. Conseguia vê-los de longe, seguindo a trilha para dentro do mato, pegando garras. Corri silencioso por entre as árvores.
            Eventualmente, fazia algum barulho, o que os deixavam mais assustados ainda, que teria algo ou alguém seguindo os passos deles. Já estavam, com o perdão da palavra, cagando de medo. Ganhei vantagem na distância e parei uns 50 metros na frente deles. Eles vinham na minha direção, totalmente na escuridão.
            O que fazer? Qual tipo de susto usar? Pular na frente deles? Jogar uma pedra? Fazer uma voz horrorosa? Todas eram boas opções, mas preferi usar uma técnica diferente. Deitei ao lado da árvore, na trilha que eles seguiam, de barriga para cima, braços caídos, imitando um corpo “morto” no meio do mato. E fiquei.
            As duas lanternas passavam de vez em quando por mim, mas eles ainda não viam. Continuaram andando, cada vez mais próximo, mais perto. Mas só quando estavam à um metro de distância é que eles viram o corpo morto.
            Bom, o grito deles assustou as pessoas que estavam na casa. Eu dei um tremelique no meio do grito, para prolongar um pouco mais.
            E depois ri. Ri do sucesso, da obra perfeita, bem-realizada, digna de um mestre dos sustos. Não houve nenhum problema e só seria melhor se eles saíssem correndo.
            Eles obviamente não gostaram da brincadeira. Mas ao contar a história para os medrosos que ficaram na sala, todos adoraram. Parecia estar comentando um filme, uma pintura, uma música. Definitivamente, uma obra de arte que ainda precisa ser descoberta por muitos.


segunda-feira, 17 de agosto de 2015

o cavalo fugiu da cocheira

           

Foi uma semana tão agitada que a crônica que sairia às 11 da manhã de hoje está sendo escrita apenas agora, às 14:55. Nem sei exatamente o porquê de estar escrevendo isso. Tantas pessoas escreveram já coisas lindas. Mas escrevo. E cada vez mais, escrever tem sido um ato de confissão pessoal, então sigo nesta “missão”.
            O vovô morreu na Terça-feira passada. Velhinho, deitou na cama, fechou os olhos e pronto. Tranquilo como sempre foi. Ele disse uns dias antes para algum primo que o “cavalo fugiu da cocheira”. E pra mim respondeu, quando afirmei que queria ser que nem ele: você vai me ultrapassar.
            Quanto mais o tempo tem passado nesta semana, mais eu percebo o quão grande ele foi. Foi o alazão da cocheira, o garanhão. Tanta gente dizendo tanta coisa. Muitas das quais eu nem fazia ideia. Foi gigante, mas não fez questão nenhuma de ser reconhecido pelo tamanho. Aliás, não fez questão nenhuma de ser reconhecido por nada. E, por causa disso, foi reconhecido. Por tudo.  
            Senti na pele e na alma o legado que carrego. Só de ter o mesmo sobrenome, de ter sido neto, de ter sido afilhado. Escrever não é um ato egoísta e pessoal. É – cada vez mais - uma responsabilidade diante da pessoa que sou e dos que foram algo para que eu pudesse ser também.
            O cavalo fugiu da cocheira. Pode ser uma das frases mais bonitas que já ouvi na vida. E o Vovô deixou claro: me ultrapasse. Pode deixar, Vô. Vou correr, muito, o máximo que puder, o máximo que aguentar, até o último segundo.
E se tudo der certo, fujo também e te encontro um dia desses. Mas só depois de ter chegado onde você chegou e poder dizer as mesmas coisas para meu neto.



segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Por que não fui médico?


Quem não me conhece, não sabe que sou: filho, neto dos dois lados, sobrinho de alguns, cunhado, concunhado, genro e primo de médicos. Como podem imaginar, já vi hemorroidas receberem elogios e escutei piadas sobre o fígado. Passava as férias correndo no hospital e invadindo a dispensa deles.
            E porque, oh Victor, você não seguiu tão brilhante carreira? Porque não usou seu intelecto e força de vontade para salvar vidas? Naturalmente, essas perguntas chegam em mim. E em todos os outros irmãos e primos que também não escolheram a nobríssima profissão.
            Existem diversas partes para achar uma resposta digna. Poderia começar contando o dia que um anzol entrou no braço do meu avô, enquanto a gente pescava,  e os médicos se reuniram em volta da ferida para conversar sobre a beleza do machucado, usando termos e expressões de felicidade. Pareciam que tinham encontrado ouro, ou um cartão de crédito ilimitado. Estavam tão animados que esqueceram de olhar ao lado e ver os filhos e sobrinhos quase desmaiando com a cena.
            Poderia também citar quando meu pai levava a gente pra “brincar” de médico. Vestia com a roupa verde, máscaras e luvas, e colocava a gente para assistir a operação. Numa fase da vida em que o único sangue que você viu era quando o nariz de alguém sangrava, podem imaginar como a gente ficava com o passeio tão bacana.
            Ou quando se reuniam entre amigos, aqui em casa, e mostravam as várias fotos e vídeos das respectivas cirurgias. “Olha esse pâncreas! Já viu coisa mais linda?”. “A cirurgia foi belíssima. Era pus pra todo lado.”. “Já dei alta pro coitado. Vai ficar com um cateter saindo pelo pescoço e conectando com o estômago.”
            Parecia filme de terror.
            Sem entender, os médicos se decepcionaram com nossa geração de "desmaiadores". Estranho, né? Porque uma criança poderia se assustar com uma barriga aberta jorrando sangue? Essas são as perguntas que naturalmente devolvemos quando recebemos o questionamento da profissão.

            Mas tentando usar uma linguagem que todos entendam, e sem desrespeitar a minha segunda opção de vestibular, porque não fiz medicina: preferi correr atrás de ser um melhor “médico de almas” do que um “médico de corpo”. Tem muita gente tendo o coração operado e não se preocupando se está batendo de verdade.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

tenha sorte de ter alguém para admirar


Quando você namora alguém, ou está juntado, casado, enrolado, tenha certeza que está pelos motivos certos. Claro, é complicado falar em motivos certos e errados numa relação, mas aí vai a dica de ouro: admiração.
A pessoa pode ser bonita, pode ser inteligente, pode ser simpática, pode ter a mesma religião que você, pode torcer para o mesmo time, pode criticar os mesmos filmes e pode até gostar do mesmo vinho branco com aquele queijo cremoso. Pode ser sua alma gêmea. Mas se não tem admiração, não tem nada. É só mais uma na sua vida.
A palavra “admirar” serve na relação tanto pela “adoração” do que o outro é quanto pela “surpresa”, pela novidade que continuamente o outro traz. Admirar o outro é o sentimento mais forte de uma relação. E o amor? O amor é necessário, mas só o amor não é suficiente. Porque a maldita rotina um dia te dirá que o “amor cansou” e vai te deixar com aquela outra pessoa, todos os dias na mesma casa, fazendo as mesmas coisas que te irritam, até ficar velho ou se divorciar.
Mas se há admiração, há um semi-endeusamento do sujeito. Você dedica sua vida para que o outro consiga continuar seguindo os sonhos dele, continue crescendo, continue firme. E, consequentemente, traga surpresas para sua vida, alimentando o relacionamento. Admirar é querer ver a outra pessoa sempre melhorando em busca da felicidade.
E você percebe que atingiu o pote de ouro no final do arco-íris quando o sentimento de admiração na relação é uma via de mão dupla. Os dois querem o mesmo para o outro. Quando isso acontece, ninguém segura a gente, amor. São 2 anos de namoro te admirando a cada segundo.

Obrigado por trazer tantas surpresas, obrigado por ser exatamente como é. Minha admiração por você é algo que não cabe em textos. Já te disse isso e já escrevi: te amo. E mais ainda, te admiro. Quero ser que nem você quando crescer.