segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

o tempo voa


Difícil vê-lo passar. Mas tão simples. Tão palpável. Só que voa. E quando voa, voa rápido, voa longe, voa de asas abertas sem barreira para impedir. Quando viu, voou. O ponteiro avança destemido, sem nunca se atrasar e te dar alguns segundos de presente. Ele é sério, honesto, claro. E rápido.
            O tempo se concretiza em alguns momentos. O tempo é o nascimento da minha sobrinha, a nova geração da família, colocando-nos como uma geração mais velha. O tempo é minha noiva comprando o vestido branco para o nosso casamento. O tempo é pagar o contador da minha própria empresa.
            O tempo é nossa arma de maturidade. Nossa força de experiência. Mas o tempo continua sendo um enigma, por que ele só quer existir para poder ser contestado. O tempo só é tempo para poder dizer, em algum momento, que “o tempo parou”.
            Essa expressão é um clichê medonho, batido, conhecido por gênios e ignorantes. E, por tal razão, tenho certeza que é verdadeira. O tempo só existe para parar.
            Não é o dia em que minha sobrinha nasceu que determinou a existência do tempo, mas o primeiro momento em que meu irmão mostrou-a para família. Aí sim, o tempo parou.
            Não é a compra de um vestido de noiva que mostrou que eu havia “crescido” e estava casando. Foram as lágrimas de uma decisão de passar a vida inteira juntos que quebraram o relógio e seguraram o tempo por tempo indeterminado.
            Não foi o contador que pago todo mês que evidenciou que virei adulto. Foi seguir um sonho com minha noiva e sentir o coração bater mais forte a cada segundo que passa. Ou melhor, não passa. Por que o tempo parou. E ficou parado.
            Lembrem-se: o tempo só existe para ser parado. E naturalmente, voltará a andar – não se preocupe. Mas faça valer cada segundo que o relógio não anda, pois só assim conseguirá viver muito mais tempo que qualquer ser imortal na terra.

O tempo voa. Mas, quando aterrissa, ah, ele para.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

abstinência

Define-se pelo fato de abster-se de algo, privar-se de algo. Além de outras coisas, me privei por duas semanas de escrever aqui. Foi estranho, foi esquisito. Passei pelos sei-lá-quantos-passos até chegar na “aceitação”. Fui além e voltei atrás. É preciso escrever. É preciso quebrar o jejum de duas semanas.
            Foi necessário um trabalho contínuo para me afastar das crônicas semanais. Um trabalho, infelizmente, nada árduo. Bem fácil e simples: não escrever. A justificativa que me dei era a falta de assunto. Procurava pelo meu quarto e já havia escrito sobre livros, sobre filmes, sobre o pé de pimenta e sobre qualquer outra coisa que pairava neste ambiente. Definitivamente, me abstive.
            E não gostei. Parece que eu antigamente sabia mais do que eu hoje e, com tal sabedoria, me obriguei a escrever semanalmente. Quer queira, quer não. Há duas semanas resolvi contestar a sábia decisão que havia tomado há mais de 1 ano e meio. Enfrentei, briguei, negligenciei. E passei duas semanas sentindo que havia um vazio-sei-lá-da-onde em mim.
            Tive que voltar. Preparar tudo novamente e acatar com o recado que meu eu de antigamente deixou na agenda “Escrever crônica”. Nós somos capazes de coisas inimagináveis, como de se comunicar com o seu “eu futuro”, sabendo que em algum momento ele precisará de um suporte emocional para continuar.
            Tendo em visto que tal abstinência me colocou em contato com o meu passado, penso agora nas sábias decisões que poderia obrigar meu “futuro eu”. Mesmo que em algum momento, a contragosto, o “futuro eu” decida parar e refletir sobre isso. Pediria para tomar mais água com limão, quem sabe. Parece fazer um bem danado. Mas nem o “eu presente” tem conseguido tal façanha.

            A verdade é que se abster de algo te propõe necessariamente a reflexão sobre uma premissa que você se dava por certa. E, geralmente, estava mesmo. Se você tomou uma decisão, provavelmente havia motivos suficientes para acatá-la. É para escrever toda semana? Desculpe a ausência, a abstinência e a malemolência. Escreverei. Obrigado “eu de antigamente” por me conhecer melhor do que meu “eu de hoje”.