segunda-feira, 30 de março de 2015

almoço



Segue a turma do trabalho para almoçar.

            Cara, você viram 50 Tons de Cinza? Todo mundo falando disso. Que maluco. Madona disse que é sexy para quem nunca transou! Ha ha ha! Eu não vi, fui ver Sniper Americano. Meio americano demais, não? Cheio de patriotismo. Os americanos estão meio confusos com o que querem. Falaram que vão invadir a Venezuela. Claro, vão pegar petróleo de todo mundo. Já já invadem aqui! Se invadirem aqui, certeza que o preço da gasolina diminui! Ha ha ha! Tá difícil né? Gastei mais de 150 reais para encher o tanque, com Etanol. Meu, quem foi o careta-politicamente-correto que não deixa as pessoas chamarem o Etanol de Álcool? Era muito mais fácil. Dava pra falar pra namorada que ia colocar álcool e se ela reclamasse que você foi pro bar, já tinha uma justificativa. Cala a boca, sua namorada é uma santa, te aguentar assim. É, ninguém achou boa a piada. Falando em piada, outro dia me contaram uma, perdi o fôlego. Piada é legal, né? Certeza que só faz bem pro mundo. Outro dia, veio na minha cabeça que quem faz piada geralmente são as pessoas mais inteligentes do mundo, são rápidos, ágeis, pensamento prático. Pensamento prático é quem tem smartphone, não essa geringonça ai. Ha ha ha! Essa geringonça tem jogo da cobrinha e resolve tudo que preciso. E pago 30% do que vocês pagam. A gente paga para ter outras coisas, tipo Waze, Whatsapp, Tinder. Você tem o Tinder? Nunca testei, deve ser muito engraçado. É! Um amigo de um amigo meu usa e, cara, sai toda a semana com alguma mulher nova. Minha tia também! Sua tia? Nossa, a família é uma bagunça. Tem aqueles 3 irmãos, sabe?  E eu que tenho 5? Sua família é que nem aquela da freira, lá? Mudança de hábito? Não! Que canta o tempo todo, na segunda guerra. Ah, Noviça Rebelde! Isso! Ha ha ha! Você falou em freira, saiu uma matéria falando sobre os escândalos da Igreja, você leu? Falava que alguns padres fizeram um calendário só com os padres gatos. Jura? Parece que foi um best seller no Vaticano. Também, chamam de país uma vila como aquela, tudo fica esquisito. Meu país, minhas leis. A gente podia criar um assim! Um calendário de cineastas gatos? Não, seu retardado, um país, que a gente cria as leis. A tal da democracia, não? Mas não funciona. É, complicado demais.  Fora Dilma, fora FHC. Fora todo mundo né? Isso é tudo uma baixaria. Baixaria mesmo é 50 Tons de Cinza. Alguém viu?

segunda-feira, 23 de março de 2015

churros, ou meu trauma por ele


Recentemente, minha namorada gravou um episódio do “TPM, pra que te quero?” ensinando a fazer churros. Quando vi o prato pronto, a ambiguidade me acertou em cheio na cara: bom ou ruim? Gosto ou não gosto? O passado voltou na minha pele.
            Isso veio de um trauma que minha querida avó materna me passou e, tadinha, ela nem tem ideia quando foi, porque foi, ou mesmo que traumatizou tanto um neto a comer churros.
            Tinha (ainda tem) um bendito restaurante que meu pai levava a gente todos os sábados, às 19 horas. A gente pedia a saladinha da casa, tomava uma Sprite, dividia um bife de tira em 4 e, vez ou outra, comia uma torta holandesa. Era o melhor restaurante do planeta e a gente conhecia todo mundo, a cozinha, tudo. O famoso e saudoso Churrasco’s.
            Viu a semelhança? Mas, espere. A gente era íntimo do restaurante. Não era dessa laia que vinha pelo FourSquare ou grupo de descontos do Groupon. A gente chegava e nem precisa fazer o pedido. Já sabiam o que todos queriam, e quem não sabe, somos em muitos na família. Ou seja, íntimos, parceiros, amigos, queridos, saudade. Tão íntimo que chamávamos o local de “Churras”.
            E foi numa volta do sítio dos meus avos que minha avó comeu um pedaço da vogal e ofereceu “churr_s” para os netos. Com a fome que eu estava, e a saudade de não ter ido no sábado por estar no sítio, fiquei maluco. Perdi o controle, quase berrei “SIM! PELO AMOR DE DEUS!”. E meu estômago começou a saborear o delicioso bife de tira com o sangue que a gente limpava depois com meio pão de queijo. A vida parecia ter sentido. O manjar dos deuses. O paraíso na terra.
            Claramente, quando chegou aquela coisa gosmenta na minha mão, que eu desconhecia, e também displicentemente chamada de “churros”, meu estômago revirou. Tentei dar uma mordida, mas fracassei. Fiz corpo fechado para o churros. Fiz macumba. Fiz um voodoo em forma de churros. Mas sempre que mandava minha maldição ao doce, era muito claro ao pronunciar a vogal certa. Alguns enganos são muito doloridos de engolir.

            Experimentei um pedaço e amei.

segunda-feira, 16 de março de 2015

reunião de condomínio

Todos os residentes do condomínio se reuniram nessa noite de terça, afinal, terça é o dia que aquele mala trabalha até tarde e ninguém aguenta sua opinião. A pauta do encontro era o que fazer com a fonte de água que fica no meio dos prédios e tinha quebrado.
O senhor mais velho começou com toda sua elegância, xingando. Ele jogou na cara de todos que tinha votado contra a porcaria da fonte, ainda mais nesse momento de crise de água. Aproveitava para reivindicar o antigo síndico, muito melhor, dizia ele, e com certeza não toleraria a compra de uma fonte.
Sua postura agressiva fez levantar uma moça mais jovem, afirmando que a maioria havia votado positivamente para a fonte, e que ele tem que respeitar a opinião dos outros, decidida por voto aberto, diga-se de passagem. Na lei do condomínio, a maioria determinaria as decisões. E pode ter certeza que a fonte não só embelezou nosso condomínio, como também valorizou. Queria vender o apartamento e a fonte aumentava alguns percentuais no valor total.
Um outro moço tomou a iniciativa e depois de uma bela introdução, afirmou que o lugar da fonte é no entulho: chamamos a equipe de resgate de fontes, arrancamos fora, e a vida segue, chore quem quiser. Problema se resolve com força e solução.
Outro moço se levanta, claramente rejeitando a ideia. Como jogar fora uma obra de arte como essa? Deveríamos preservar! Arte não se quebra, se valoriza. Uma peça dessas faz a gente pensar todos os dias e refletir. Além do mais, saiu do dinheiro do prédio, não de ninguém em particular.
A resposta soou mais brava do que deveria, mas não se pode fazer nada quando o assunto é fonte quebrada. O moço primeiro jogou na cara que uma parte da fonte é dele, afinal, havia pagado para o prédio, que pagou pela compra. O moço segundo concorda, mas como a fonte é uma só, não se pode dividir e a decisão tem que ser conjunta.
Um terceiro moço pede para esquecerem um pouco a fonte e falarem do síndico. Ele, ora pois, fora quem teve a ideia e trouxe para a pauta. Ainda faz uma acusação: viu o síndico dar uma nota de vinte reais para o carreteiro que trouxe a fonte.
Essa informação gerou protestos na sala naquela noite de terça-feira. O senhor mais velho balbuciou qualquer coisa, algo como achar um absurdo terem proibido armas. A moça afirmou que o dinheiro fazia parte do pagamento do carreteiro, e como não tinha nota para emitir, não saiu no relatório de despesas, mas para todos ficarem tranquilos: o prédio não estava numa situação tão ruim quanto parecia. O velho não aceitou e queria logo obstruir a vaga do carro dela, muito melhor que a dele.
Um adolescente, sentindo pulsar seus hormônios na veia da testa, se levanta já arremessando a cadeira para trás. Sua solução: quebrar tudo e deixar quebrado para todos verem a inutilidade da fonte. O importante é ver como vocês são todos imbecis.
Rejeição enorme por parte de todos. Xingamentos, afinal, ele é jovem, não sabe de nada. Ele pegou sua cadeira e voltou a se sentar, quieto.
Nesse barulho todo, o homem mala que trabalha até tarde de terça-feira entrou no prédio mais cedo, viu a fonte sem funcionar. Da sua maleta de engenharia, tirou uma chave de fenda, mexeu aqui e lá, e pronto, a fonte cuspia água da chuva de novo. O prédio estava salvo. Quer dizer, só quando acabasse a reunião.

segunda-feira, 9 de março de 2015

poesias


Escrever é poetizar
Sobre como pular
Uma linha e continuar
A ler como não tivesse o feito e terminar a última linha distante da anterior.

Usar palavras que
Ninguém nunca mais usou no mundo
Como “âmbar” ou “putrificar”
Quem sabe mesmo parar de usar o verbo “amar” e jamais rimar “ar” com “ar”
(por que isso é pobre e eu posso me dar o direito de um quinto verso)

Pula-se uma linha, mas
Começo o texto na linha seguinte
Requinte? Só das palavras que saem do
Meu laptop e enchem a poesia
De letras que começam na
Linha de baixo todo dia

Dizem que o poeta é
Um ser incompreendido
Ou um pouco metido
Quem sabe talvez um mané

Mas afirmo que na nova fase da vida
Vida que vivo tão intensamente
Entendo que não são os poetas
Mas sim suas poesias que
São incompreendidas porque pulam
Linhas, usam palavras de velhos e
Rimam coisa com coisa para ficar bem difícil de ler e assim poder ser


segunda-feira, 2 de março de 2015

DR moderna


            Não é uma abreviação de “doutor”, e sim de “Discutir a Relação”. O título da crônica poderia ser como “DaR moderna”, mas vale mais discutir o fato dessa modernidade nas discussões amorosas do que suas abreviações incongruentes.
            Senti saudade da época em que a gente via casais se matando na rua, xingando um ao outro no shopping, dando tapas na cabeça porque ele tinha traído ela. A famosa e conhecida “DR”, ou “DaR’, se preferir. Faz falta ver um pouco dessa empolgação maluca dos casais antigos.
            Digo isso pois entrei no ônibus essa manhã e no aperto diário do nosso dia, não tinha como não ler as mensagens que essa garota enviava ao seu parceiro amoroso. Ela estava brava, muito brava (julgo isso pela quantidade de emoticons que ela usava somada à quantidade de exclamações). O tema da discussão, depois de muitas carinhas tristes, decepções e três pontinhos, era o fato de ele ter aceitado um amiga do colégio no Facebook.
            Ela pediu para ele parar de serem amigos. Ou melhor, corrigia ela, deixar um post na timeline dela dizendo que amava só a namorada dele e que as vagabundas “pode tudo vazar”. Ele não gostou da ideia e sugeriu apenas desfazer a amizade. Ela não se deu por vencida, lembrando que ele não havia compartilhado a nova foto do perfil dela. Ele se justificou: fez isso nas últimas 5 fotos de perfil dela, todas trocadas nessa semana! Ela ficou mais brava ainda, usando outros emoticons mais raivosos. Que falta de respeito.
            Sinto um pouco de falta da época em que trair alguém era de fato sair com a pessoa, beijá-la, e depois o sujeito ou a sujeita eram descobertos pelos parceiros e rolava aquela treta imensa e intensa. Era assunto no colégio quando descobriam um novo corno na turma. Era pauta de redação se está permitida a mulher bater no homem depois de ser traída. Era muito mais animado acompanhar de perto toda a DR alheia.
            Hoje em dia, parece que ficou tudo pior, mais escondido, menos emocionante. Do like vem o compartilhar, depois o inbox, um snapshat e o pior, cai no whatsapp. Já está no mais alto nível de traição. Falta mesmo é marcar um encontro no Skype e a traição está consumida. DaR moderna é outra coisa.